
Cartilha educativa para orientação materna sobre os cuidados com o bebê prematuro
PERCURSO METODOLÓGICO
Para o desenvolvimento de material didático-instrucional utilizamos a educação conscientizadora, também chamada problematizadora, fundamentada no referencial teórico de Paulo Freire, tendo por base a metodologia participativa. Essa educação, ao contrário da educação bancária, implica num constante ato de desvelamento da realidade, buscando a emersão das consciências, resultando na inserção crítica do homem na realidade. Tem como objetivos a transformação social, a troca de experiências, o questionamento, a individualização e a humanização(12-13).
Na pesquisa participante, utilizamos o método que enfatiza a produção e comunicação de conhecimentos, propondo-se a: promover a produção coletiva de conhecimento, rompendo o monopólio do saber e da informação e permitindo que ambos se transformem em patrimônio dos grupos; promover a análise coletiva do ordenamento da informação e da utilização que dela se pode fazer; promover a análise crítica, utilizando a informação ordenada e classificada a fim de determinar as raízes e as causas dos problemas e as possibilidades de solução; estabelecer relações entre os problemas individuais e coletivos, funcionais e estruturais, como parte da busca de soluções coletivas aos problemas enfrentados(14).
Nessa seqüência metodológica há quatro fases: 1) montagem institucional e metodológica da pesquisa participante; 2) estudo preliminar e provisório da zona e da população em estudo; 3) análise crítica dos problemas considerados prioritários e que os pesquisadores desejam estudar e 4) a programação e execução de um plano de ação (incluindo ações educativas) para contribuir para o enfrentamento dos problemas colocados(14).
Procuramos, inicialmente, verificar se havia interesse e disponibilidade dos sujeitos envolvidos no processo ensino-aprendizagem visando o treinamento materno para a alta do filho prematuro, através da aderência de educadores e educandos ao projeto.
Local do estudo
Berçário de prematuros, situado no 8º andar do Hospital das Clínicas, Campus da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (HCFMRP-USP), hospital-escola público, de porte especial e de referência terciária para atendimento perinatal da regional de saúde de Ribeirão Preto, SP.
Sujeitos da pesquisa
Participaram do estudo duas enfermeiras (e1 e e2), sendo uma delas enfermeira-chefe, 53 anos de idade e 26 anos de enfermagem, 9 deles no campo do estudo, e a outra com 30 anos e com vínculo empregatício há 3 anos no campo do estudo; duas auxiliares de enfermagem (a1 e a2), uma com 53 anos de idade e 16 anos na enfermagem e a outra, 38 anos de idade e 6 anos de experiência na área e quatro mães de bebês prematuros (m1, m2, m3 e m4), internados no berçário, cujas características estão descritas na Tabela 1. As enfermeiras e auxiliares de enfermagem foram escolhidas por atuarem na unidade neonatal de cuidados intermediários há mais de três anos e apresentarem ampla experiência na orientação e preparo de mães de bebês pré-termo para a alta hospitalar de seus filhos.
Utilizamos os círculos de discussão para coleta de dados. É considerada uma técnica de abordagem qualitativa valorizada por conseguir trazer à tona as opiniões, relevâncias e valores dos sujeitos da pesquisa em relação a um determinado tema(15).
Primeiro foram instalados dois pequenos círculos de discussão: um constituído por quatro participantes: duas enfermeiras (e1 e e2) e dois auxiliares de enfermagem (a1 e a2), e outro pelas quatro mães de prematuros (m1, m2, m3 e m4). Nesses dois grupos apresentamos a proposta de desenvolver material didático-instrucional para o preparo das mães para a alta hospitalar do filho prematuro e solicitamos que expressassem as suas expectativas frente à proposta. Estimulamos o levantamento dos problemas vivenciados na orientação para a alta hospitalar e dos temas relevantes para preparar a mãe para a alta hospitalar do bebê prematuro, na visão da enfermagem e das mães.
As atividades nos pequenos círculos de discussão foram organizadas tendo como foco os seguintes questionamentos:1. Qual a relevância do material educativo nas atividades de educação em saúde para a alta hospitalar?
2. Quais temas e seus conteúdos deveriam ser trabalhados no material educativo?
3. Que tipo de material de ensino deveria ser utilizado?
As informações recolhidas foram devidamente organizadas e sistematizadas. Entretanto, enfatiza-se o aspecto de a pesquisa não se deter no recolhimento do que existe: o grupo deve participar dos dados encontrados para, através da conscientização, tentar a superação de problemas(16).
O produto concreto do processo vai do intercâmbio de experiências à objetivação, expresso através de temas geradores, os quais se referem a conteúdos específicos capazes de sintetizar o analisado. Os temas geradores são o conjunto de opiniões mais relevantes e significativas, em torno do problema apresentado. O conteúdo de cada tema gerador é especificado, determinando as unidades de trabalho(17).
Após a realização dos dois círculos de discussão, houve um círculo de discussão maior, incluindo todas as participantes (e1, e2, a1, a2, m1, m2, m3 e m4). Os aspectos enfocados e identificados foram retomados para que elas se reapropriassem de suas expressões e sugestões. Nessa reunião conjunta, os participantes verificaram se houve correspondência entre seus anseios e críticas e discutiu-se sobre a forma do material educativo.
Foram realizados, ao todo, quatro encontros, no período de maio a outubro de 2001, havendo a instalação dos "grupos de estudo ou círculos de discussão", com duração média de uma hora, nos quais o papel de animador foi desempenhado pela autora do presente estudo. As discussões foram gravadas na íntegra e, posteriormente, transcritas para a análise. Além disso, utilizamos o Diário de Campo para registros de manifestações não-verbais.
Utilizando as unidades de trabalho trazidas pelas participantes, as pesquisadoras elaboraram os conteúdos, tendo por base a literatura. A revisão desses conteúdos foi feita por quatro enfermeiras, uma professora de enfermagem e três enfermeiras assistenciais, sendo duas de unidade neonatal e outra do banco de leite humano.
A retroalimentação, no final dessa fase, foi a devolução do material confeccionado ao grupo. É, precisamente, nessa fase que reside a característica desse tipo de pesquisa, voltado para a ação, no sentido de se tentar fazer alguma coisa além da mera constatação de problemas(16). Uma cópia do material piloto, de manufatura simples e artesanal, com os temas desenvolvidos e suas respectivas ilustrações, foi entregue, em casa, para cada participante a fim de que pudessem manuseá-lo e ler tranqüilamente.
Enfermeiras e auxiliares de enfermagem foram instruídas sobre os tópicos para avaliar, validando o conteúdo e aparência do material didático-instrucional. Para tal, elaboramos um instrumento, tendo por base outro, já proposto(18), para avaliação da dificuldade e da conveniência de materiais educativos, denominado Suitability Assessment of Materials (SAM).
Para as mães, solicitamos que destacassem os termos técnicos que porventura não tinham sido entendidos e, após uma semana de prazo, elas foram procuradas para se expressarem a respeito da cartilha.